(c) A. Aubrey Bodine - High Rise Construction (1950)
I.
Esvaem-se no tempo pedaços de um corpo
Esvaem-se(sem mácula, sopros de um vento indefinido)
no tempo(reaberto sobre a planície calma, desfeita em sopros)
pedaços(de feno. Sobrevoam-na almas. Penadas. E uma só)
de um corpo(feita, qual estrela aberta rente aos olhos.)
Esvaem-se no tempo pedaços de um corpo
II.
Por onde caminhamos quando os olhos se fecham
Por onde(Espreitamos, a espaços, curtas pausas. Cintila um luz.)
caminhamos(Abertos, os olhos resguardam-se. Intensidade.)
quando os olhos se(Descobrem, desvendam-se em magias plenas)
se fecham(visitando de novo mais um Inverno claro.)
Por onde caminhamos quando os olhos se fecham
III.
Corre um vento forte sobre a minha cabeça
Corre(Livre, a consciência desenganada do mundo)
um vento(frio. Sobressai na pele. Resguardo-me do medo.)
sobre(Tudo avança em direcção a essa linha invisível, finita,)
a minha cabeça(dormente, que se revolta, esquecida do espaço.)
Corre um vento forte sobre a minha cabeça
IV.
A inconsciência faz-se dos medos dos outros
A inconsciência(Levanta-se, manhã clara, sobre a cidade.)
faz-se dos(Escombros. Despertam também para esse dia)
medos(de calores e vento. Faz Verão. Espera por pedaços de luz)
dos outros(mais fortes que a intensa fraqueza da noite.)
A inconsciência faz-se do medo dos outros
V.
Quando os olhos falam do mar crescem muros em terra
Quando os olhos(São seres abertos na distância. Acorrem passados vários.)
falam do mar,(Fiéis e profundos. Saem do místico novelo dos dias)
crescem muros(renascidos de uma cinza volátil, despregada,)
em terra(como se fossem chama e luz e fogo e quente.)
Quando os olhos falam do mar, crescem muros em terra
VI.
Toco-te. E o teu rosto é o mundo todo desejado
Toco-te.(A uma hora qualquer. Encontro o dia)
E o teu rosto é(marejado, feito de calor. O corpo desfaz-se em carícias)
o mundo(de encontro ao solo aquecido das mãos.)
todo desejado(, o amanhã será hoje à mesma hora.)
Toco-te. E o teu rosto é o mundo todo desejado
VII.
Prefiro a chuva às flores colhidas
Prefiro(Saborear cada novo fôlego que me ofereces,)
a chuva(intenso mar. Corpos caídos, rentes,)
às flores(verdes, quando se acabam os trabalhos do campo)
colhidas(na pradaria fértil, oferecida e calma.)
Prefiro a chuva às flores colhidas
VIII.
Chega-te mais perto. Vem
Chega-te(Preferir o fruto que colheste? Retalhar,)
mais(a fundo, cada pedaço de verde. Solta-se um gemido)
perto.(Demasiado próximo. Estridente, angustiado,)
Vem(ao meu encontro. Toca-me sem arrepio.)
Chega-te mais perto. Vem
IX.
Para onde olhas quando olhas?
Para(Quem são estes dias? Passas)
onde olhas(sempre que te miro. O tempo)
quando(acaba, resvala por entre os dedos.)
olhas(e é como se a noite acordasse agora.)
Para onde olhas quando olhas?
X.
Sempre que respiras o transe do meu corpo
Sempre(Renegado por carícias, perco-te em tremores)
que respiras(mansamente, fora do meu beijo coagulado em tua face,)
o transe do(mundo inteiro, miragem arquejante do teu sono.)
meu corpo(E minhas mãos sobrevivem à ausência. Fracos de fome.)
Sempre que respiras o transe do meu corpo
JEO