Baloiço-me a caminho dos teus olhos
Vens ter com o meu beijo
E eu beijo-te
através da poeira
enquanto pairo
no ar.
No ar
Vens ter aos meus olhos
Como sombra
E eu beijo-te
de longe
através da poeira poisada no ar.
Se é o teu corpo o que abarco
Baloiço-me agora
Enquanto te beijo
de longe
no ar
já sem poeira.
Lisboa, 2009
Mulher
Epitáfio
A espaços, entendo-me. E confio no juízo que faço das coisas. Posso parecer distante, mas estou por perto. Trago dentro de mim o mundo que escolhi como casa. E essa é tarefa larga, solitária, silenciosa. Prescrevo para mim, como remédio, medicação exacta. E a terapia sustenta-me a consciência e faz-me percorrer caminhos, dar saltos fugazes ou calar gritos prestes a acontecer.
Dissolvo-me com água após as principais refeições. E recupero. Aguardo apenas por uma chamada do meu corpo. Quando for hora, lá estarei para lhe dizer que estou contente com o que fui e que a carga que, afinal, me fez mover se manteve intacta e forte e solidária.
O meu corpo ao meu corpo.
A espaços, entendi também as fórmulas do amor e aprendi a desfazer-me de desenganos. Fui íntegro nas palavras que proferi e nada fiz que matasse noutro alguém a expectativa de qualquer promessa. Dormirei em paz. A minha alma saberá onde encontrar-se. Adeus.
(Texto escrito em Lisboa, Dezembro de 2008)
Compromissos
Porque insistimos em tentar limpar o erro, a má memória, o descalabro ou desencanto, pergunto. Somos empurrados para esse exercício quase imposto de repor a legalidade dos factos quando o que verdadeiramente procuramos é, afinal, vencer a etapa seguinte no caminho. Somos levados a crer que temos obrigações para com o outro quando, na realidade, não assumimos compromissos desde que nascemos e com absolutamente ninguém. Nem connosco.
Tenho de deixar de fumar.
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